Psicologa Organizacional

9 de maio de 2015

AS ESCOLAS PRÉ-SOCRÁTICAS



AS ESCOLAS PRÉ-SOCRÁTICAS

Os chamados filósofos pré-socráticos, que viveram entre os séculos IV a.C. a V a.C., provêm dessas cidades e essa origem os identifica. Assim, falamos de Tales de Mileto,
Anaxímenes de Mileto, Pitágoras de Samos, Heráclito de Éfeso,
Empédocles de Agrigento, Anaxágoras de Clazômena, Leucipo de Abdera, Demócrito de Abdera, Parmênides de Eleia.
Em vista da distância histórica e das fontes documentais precárias que permaneceram para a posteridade, em sua maioria fragmentos de obras, algumas completamente perdidas, esses primeiros filósofos são estudados de maneira agrupada, isto é, por região, ou teorias com algum grau de semelhança. Por isso, falamos em escola jônica, isto é, as colônias gregas localizadas na Ásia Menor; escola eleata, de Eleia na Magna Grécia. Os dois outros grupos são reunidos por preocupações semelhantes e provêm de diferentes partes da região expandida da Grécia.
O que você deve perceber nas teorias, que serão brevemente expostas a seguir, não é a verdade ou falsidade de suas afirmações, mas a maneira como organizam as explicações, buscando como causa a phýsis em sua visibilidade ou a arkhé. O visível e o invisível nem sempre separam e definem esses termos, pois, em alguns casos, eles coincidem.
Vamos conhecê-las!

A escola jônica
Chamados de físicos ou naturalistas, os filósofos considerados dessa divisão são: Tales de Mileto (cerca de 625/4-558/6 a.C.), Anaxímenes de Mileto (cerca de 585-528/5 a.C.) e Anaximandro de Mileto (cerca de 610-547 a.C.), que elaboraram teorias hilozoístas, atribuíram movimento próprio e transformação à matéria.
Tales de Mileto é considerado o primeiro filósofo e também um dos 7 Sábios da Antiguidade.
Aristóteles (em Metafísica, I, 3.983 b6) expressou da seguinte maneira as ideias de Tales: “Tales, o fundador de tal filosofia [cosmologia], diz ser a água [o princípio], levado sem dúvida a esta concepção por ver que o alimento de todas as coisas é úmido, e que o próprio quente dele procede e dele vive (ora, aquilo de que as coisas vêm é, para todos, o seu princípio)”. Existem informações secundárias sobre certas habilidades práticas de
Tales, que teria sido político e uma espécie de engenheiro, por ter estudado a causa das enchentes do rio Nilo em sua viagem ao Egito e pretender desviar o curso de um rio. A ele também se atribui a descoberta da constelação da Ursa Menor, um auxílio à navegação.
A definição da água como phýsis ou princípio explicativo de tudo o que existe e de como tudo veio a ser confere, ao mesmo tempo, unidade à causa e à ideia de que esta causa, de onde tudo parte e para a qual regressa, possui um movimento que lhe é inerente. Pode-se encontrar, portanto, na natureza um elemento que explica a origem da vida e o seu próprio movimento desta: no estado úmido, encontra-se vida; no ressequido, a morte.
Anaxímenes de Mileto segue o raciocínio de Tales, escolhendo na natureza um elemento que organiza e explica a ordem do universo. Para ele, este é pneuma, palavra traduzida por ar, sopro vital e também alma ou espírito. Anaxímenes concebe o ar como phýsis e como arkhé. A ordem do mundo se estabelece no ritmo de uma respiração vital. Em um fragmento compilado por Simplício (Aécio, I, 3.4), lemos: “Como nossa alma, que é ar, soberanamente nos mantém unidos, assim também todo o cosmo sopro e ar o mantém”. Nesse sentido, novamente, a matéria, o ar em diferentes estados, interna e externamente, possui a qualidade de movimentar a si mesmo.
A definição de phýsis contrasta com a de Anaximandro, no que diz respeito ao aspecto indeterminado do apeíron. O ar é infinito, mas determinado como matéria menos corpórea do que a água.
Anaximandro de Mileto foi discípulo de Anaxímenes. Em sua cosmologia, o princípio explicativo que rege a ordem das coisas torna-se mais claramente arkhé, pois não corresponde mais a um elemento mais ou menos visível na natureza. Tratase do ápeiron; o prefixo “a” significa ausência ou negação de
“peras”, que significa limite. Literalmente ápeiron é o “sem limite” ou ilimitado, entendido pela quantidade, e indeterminado ou indefinido, pela qualidade.
O apeíron é um princípio eterno, imortal e imperecível, isto é, não foi gerado, não degenera e não finda. Essa é uma importante distinção de sua cosmologia em relação às
teogonias, nas quais os deuses eram gerados e, mesmo que fossem imortais, não existiram desde sempre. O devir surge do apeíron como ordem temporal das coisas que, ao fim, a ele retornam. Essa ordem temporal é entendida como uma lei necessária, sob o jugo da justiça e injustiça. Conceitos que se desprendem do vocabulário da polis e integram as cosmologias.

A escola pitagórica ou itálica
 A existência histórica de Pitágoras de Samos (cerca de 580/78-497/6 a.C.) não foi comprovada. Costuma-se atribuir a ele a própria composição da palavra filosofia (philia+sophia).
O filósofo seria um frequentador de jogos públicos que não se deixaria levar pela emoção, mas pela observação distanciada.
Essa definição bem como a “paternidade” do teorema de
Pitágoras não são comprováveis e se misturam à figura lendária do filósofo que teria nascido na ilha de Samos, ao lado da Ásia
Menor. Já o pitagorismo existiu como movimento, no outro extremo do mapa, na Magna Grécia, atualmente, sul da Itália e Sicília.

Ensinamentos, contribuições e decadência do pitagorismo
Com base no orfismo, a doutrina pitagórica acreditava na reencarnação da alma e propunha um processo de purificação através da vida contemplativa ou theoria, isto é, contemplar com os olhos do espírito, examinar para conhecer. Cultivava-se uma prática de purificação por meio do silêncio, do isolamento e da abstinência de sexo, carnes e bebidas alcoólicas. Buscavase a alma de tipo contemplativa, evitando as de tipo cúpida e mundana, limitadas às esferas da paixão e da vaidade.
Esse aspecto moral jamais desapareceu do pitagorismo, compondo um grupo em seu interior conhecido como acústicos ou acusmáticos. O outro grupo era o dos matemáticos, que, segundo Aristóteles, muito contribuíram para o avanço da matemática, criando a geometria e estabelecendo a relação entre geometria e aritmética.
Definiram pela primeira vez a ideia de unidade, de sequência ordenada de números, distinguiram o número par (divisível e ilimitado) e o número ímpar (indivisível e limitado), definiram campos, limites e pontos.

Quando falamos em matemática, é bom lembrarmos que se trata de um conhecimento que possui diferenças fundamentais com o que hoje entendemos por essa matéria. Em primeiro lugar porque os números não são algarismos, uma abstração inventada pelos árabes, mas palavras, sendo que a ideia de zero não existe.
O número um, por exemplo, representa para o pitagorismo esse princípio ou arkhé de todas as coisas, a harmonia e proporção, a unidade primeira, na qual existe a totalidade de todos os números.
Todo o conhecimento depende dessa unidade e do movimento que se estabelece a partir dela.
O início do desenvolvimento da matemática foi o estudo da lira tetracorde, a lira de quatro cordas de Orfeu, utilizada nos rituais de purificação. Desse estudo surgiu uma figura geométrica composta por 10 pontos, distribuídos em forma de triângulo, com quatro pontos de cada lado e um no centro. A figura foi chamada de tetráktys da década, ou seja, o número dez (década), constituído por quatro (tetra) pontos, com um ponto no centro. O resultado é uma figura perfeita que combina a unidade, a díade, a tríade e a quadra e resulta em uma harmonia perfeita entre números pares e ímpares:
Dessa figura, resultam outras, que os pitagóricos intitulam de número quadrado e o número retângulo. A continuidade dos estudos matemáticos revelou outras figuras geométricas, o pentágono e a estrela de cinco vértices nele contida, mas conduziu também à ruptura dos pitagóricos, que se deu entre o grupo dos matemáticos e os que prezavam os ensinamentos morais e as práticas ascéticas. O famoso teorema de Pitágoras, isto é, que se atribui a Pitágoras, mostra o descaminho do ideal que buscava a unidade no número, pois não se pode mais representar um número inteiro nem por uma fracção de números inteiros.
Heráclito de Éfeso (cerca de 540-470 a.C.)
Heráclito de Éfeso é considerado, ao lado de Parmênides, o fundador de preocupações centrais da filosofia e do conhecimento. Você pode perceber a presença do orfismo no fragmento abaixo, transcrito em seu contexto e a ênfase dada ao movimento:

Fragmento XXXVI:
Orfeu poetou: “para o vapor é água mutação, para as águas, morte; da água, terra, e, da terra, novamente água: desta, então, vapor, todo éter modificando-se” (Fonte: Clemente de Alexandria, Stromata, VI, 17)
Heráclito daí colhe suas palavras, quando assim escreve: “para os vapores, tornar-se água é morte; para a água, tornarse terra é morte; mas da terra nasce a água, da água, vapor”
(COSTA, 2002, p.93). Essa transformação das coisas, que é incessante, transparece nos famosos fragmentos abaixo citados, (idem, p. 205):

Fragmento XLIX:
“Nos mesmos rios entramos e não entramos, somos e não somos” . Fragmento L:  “Não é possível entrar duas vezes no mesmo rio”.

Esses fragmentos refletem a questão do movimento e a transformação constante, na qual estamos imersos. Não é possível entrar duas vezes no mesmo rio, pois as águas não são mais as mesmas e nós não somos os mesmos, estamos todos em constante estado de mutação. Essa mudança, no entanto, ocorre de maneira equilibrada ou como equilíbrio de
opostos, resultando em harmonia por meio do conflito.
Heráclito nomeia dois princípios para expressar esse movimento e o conflito que existe dentro de uma medida: o lógos e o fogo primordial. Eles são arkhé como princípios organizadores e explicativos de todas as coisas. O fogo que nunca se apaga não corresponde exatamente ao elemento natural, mas simboliza a medida equilibrada de todo movimento. O lógos é uma espécie de lei que comanda a multiplicidade aparente das coisas, conferindo-lhe unidade e harmonia.
O mundo é um eterno devir para Heráclito, mas não como movimento desordenado, não há caos e particularidades, mas há o lógos que ordena e equilibra a realidade aparente.
Heráclito critica veementemente todo conhecimento que se baseia na opinião (dóxa), critica também os poetas
Homero, Hesíodo e os pitagóricos. Como Parmênides e Platão,
Heráclito funda seu pensamento na oposição entre aparência e essência.

A escola eleata
O principal eleata é Parmênides (cerca de 530-460 a.C.).
Quando lemos o fragmento do belo poema intitulado “Sobre a natureza”, imaginamos tratar-se de um poeta e não daquele que inicia a lógica, fundando os princípios de identidade e de não-contradição. Parmênides funda igualmente a ontologia, ao utilizar a palavra Ser para expressar a arkhé de todas as coisas.
No poema, após evocar as musas, que mostram o caminho à carruagem conduzida por aquele que quer saber, abrindo as portas do céu e ultrapassando umbrais, ele e as musas chegam à Deusa (a razão) que se dirige desta forma ao aprendiz:

Pois bem, eu te direi, e tu recebes a palavra que ouviste, os únicos caminhos de inquérito que são a pensar: o primeiro, que é e portanto que não é não ser, de Persuasão é caminho (pois à verdade acompanha); o outro, que não é e portanto que é preciso não ser, este então, eu te digo, é atalho de todo incrível (*no qual não se deve crer); pois nem conhecerias o que não é, nem o dirias.
(In: PRÉ-SOCRÁTICOS, 1978, p.142).

Só aquilo que é (o Ser) pode ser pensado e dito. O que não é (o não-Ser) não pode ser pensado, nem dito. Parmênides cria, portanto, uma identidade entre ser, pensar e dizer que elimina o seu oposto como via de investigação impossível. O primeiro caminho, o único que deve ser percorrido por aquele que quer conhecer, é o caminho da verdade (alétheia). O caminho a ser evitado é o da opinião (dóxa). O Ser, possível de ser conhecido por meio do primeiro caminho, é entendido por Parmênides com base nas seguintes características: não foi gerado e não perece, isto é, é eterno, fixo, imóvel, uno, contínuo, inteiro, sem fim, indivisível, idêntico a si mesmo, pleno, encontra-se em limites como o de uma esfera.
Aparência e essência, novamente, são os polos estruturais da oposição entre opinião, como uma falsa ou aparente verdade, e essência, a que é verdadeira e alcançável apenas pelo pensamento. Nesse sentido, Parmênides concorda com Heráclito e ambos criticam a dóxa. A grande divergência entre os dois filósofos ocorre em função do movimento e da imobilidade do Ser.
Zenão de Eléa (cerca de 504/1-? a.C.), discípulo de
Parmênides, não escreveu uma cosmologia, mas se empenhou em criar raciocínios lógicos complicados, chamados aporias, para defender seu mestre, submetido a verdadeiras pilhérias ao não aceitar o movimento como hipótese para o conhecimento verdadeiro.
Podemos afirmar que jamais a filosofia nascente será a mesma diante desse confronto Parmênides-Heráclito, pois como explicar o movimento e a multiplicidade que enxergamos no mundo como resultado de um princípio imóvel e completo que não admite o movimento? Ou como pensarmos o mundo como devir/movimento constante, sem precisar um princípio de identidade que se separa da realidade transformadora?

A escola da pluralidade
Esta escola é justamente caracterizada por teorias que multiplicam o princípio ou ser parmenediano e buscam conciliá- lo com o movimento heraclitiano. Vamos conhecer os princípios nomeados pelos filósofos dessa escola?
Empédocles de Agrigento (cerca de 490-435 a.C.): compõe sua cosmologia com base na combinação do ser parmenidiano, dividido em quatro raízes (rizómata) e duas forças de movimento: philia e neikos, amor ou amizade e ódio.
As quatro raízes correspondem aos quatro elementos naturais: terra, água, ar e fogo. Elas, embora separadas, guardam as características do ser de Parmênides. A diferença é que para
Parmênides o ser era indivisível. A solução para o conflito, originado pela oposição Heráclito-Parmênides, é admitir o movimento de união e separação. No início de tudo, as raízes estavam misturadas, foi necessária a ação de neikos para separá-las. Separadas, contudo, elas não geram, nem reciclam suas características próprias. Philia vem, portanto, reunilas novamente, até o momento em que se faz necessária a intervenção de neikos. Desse movimento de união e separação, surgem todas as coisas e a ordenação da natureza.
Anaxágoras de Clazômena (cerca de 500-428 a.C.):
Se as raízes multiplicam o ser de Parmênides, as sementes (spérmata) pensadas por Anaxágoras, com as mesmas características do ser parmenediano, fragmentam mais ainda o ser. Elas não são visíveis ao olho humano. Em relação ao movimento, Anaxágoras, diferentemente de Empédocles, nomeia uma só força: noûs (inteligência cósmica). No início havia uma indissociação de elementos, misturados em um magma primitivo. O noûs criou, de fora dessa mistura, um movimento turbilhonante que separou as sementes de maneira múltipla e originou tudo o que existe. Leucipo de Abdera (outras fontes se referem a Mileto ou Eleia) (cerca de 500-? a.C.) e Demócrito de Abdera (cerca de 469-360 a.C.): esses atomistas, além de radicalizarem a multiplicação do ser parmediano, criam em sua teoria uma compreensão inédita: a admissão do não-ser como vácuo.
Átomo, que literalmente quer dizer o não-cortável, corresponde ao ser de Parmênides, à diferença que são múltiplos, infinitos e automoventes. Se eles correspondem ao ser, o espaço, no qual se movem, não pode coincidir com a ideia de ser. Logo, o espaço vazio, no qual os átomos se movem, chocando-se uns contra os outros e originando todas as coisas existentes no universo, é o vácuo ou o não ser. Nessa teoria, que não descarta a ideia central de ser em Parmênides e não nega o movimento do qual tudo se origina de Heráclito, encontramos a variação mais ousada das teorias pluralistas e que exercerá forte influência em seus sucessores.



Fonte: Educação, história e sociedade : módulo 1 : Filosofia e  Educação, volume 2 / Elaboração de conteúdo: Carla  Milani Damião. – [Ilhéus, BA] : UAB/UESC, [2009].  1 v. (várias paginações).

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