O NASCIMENTO DA FILOSOFIA
Segundo
os historiadores, a filosofia tem data e local de nascimento: século V a.C. em
Atenas, Grécia Antiga. Considerase também o surgimento, no século anterior,
século VI a.C., das cosmologias, teorias sobre a ordenação da natureza que
investigam a origem e o princípio de todas as coisas. Os cosmólogos não eram
atenienses, mas gregos, em sua maioria, provindos da expansão geográfica da
Grécia na Antiguidade.
Ao
determinar a data e o local de origem da filosofia, os historiadores buscam
fornecer um entendimento específico desse tipo de conhecimento que o torna
diferente da religião, por sua característica política e antropocêntrica. Esse
sentido de filosofia, portanto, não se confunde com a utilização da palavra em
sentido amplo ou vago, como “filosofia de vida” ou “filosofia do trabalho”.
Por
outro lado, não é difícil perceber associações com outras culturas e religiões,
quando estudamos os problemas que orientaram as primeiras teorias na filosofia.
Vemos, com isso, um problema de interpretação em relação à origem, que se
estendeu ao longo dos séculos e que se tornou motivo de debate na primeira
parte do século passado.
Alguns
estudos demonstram a assimilação de conhecimentos científicos, como a
astronomia e a matemática, provenientes do Oriente: Egito e Mesopotâmia. Essa
“importação” de conhecimentos ocorreu devido à expansão marítima grega, que
ocorria em função do comércio e da colonização grega na Ásia Menor e Sul da
Itália.
Várias
teorias em relação ao surgimento foram comprovadas ou reprovadas, em alguns
casos em função de descobertas arqueológicas, no século passado (XX), de
documentos até então desconhecidos, ou mesmo de documentos já conhecidos e que,
relidos com o suporte dos novos meios tecnológicos, revelaram textos sobre
textos, isto é, palimpsestos, no reaproveitamento do material utilizado nos manuscritos:
o papiro.
Antes
mesmo da descoberta do Papiro de Derveni, alguns historiadores do período atribuíam
elevada importância à relação entre mito, religião e filosofia, inovando a
interpretação que datava desde o período helênico, com Diógenes Laércio, na
obra Vida e doutrina dos filósofos, século II, que afirmava uma clara distinção
entre razão (Filosofia) e mito (narrativas sobre divindades e seus feitos).
Estudos mais aprofundados demonstraram existir um tipo de conhecimento
organizador da realidade nas narrativas fabulosas do mito. Essa estrutura racional
do mito, segundo Francis M. Cornford, em Principium Sapientiae. As origens do
pensamento grego, obra publicada em 1952, estaria presente nas primeiras
cosmologias, procurando comprovar o vínculo entre mito, religião e filosofia.
Chauí
(2002) dialoga com importantes historiadores da filosofia as teses extremistas
(mito ou razão; influência oriental ou originalidade ocidental) sobre a origem
da filosofia e encontram um meio termo nos seguintes aspectos:
Em relação ao mito
Houve,
no mito, uma aproximação de deuses e homens, seja pelo caráter antropomórfico
dos deuses, seja pela divinização dos homens que mantinham um estreito vínculo com
as divindades por meio da narrativa do poeta-aedo, das sacerdotisas e pela
prática de sacrifícios. Reconhece-se nessas narrativas uma organização racional
que busca explicar a origem do mundo e a organização social.
Em relação à invenção grega
O
que os gregos nos séculos VI e V a.C. inventaram, além do que incorporaram de outras
culturas, diz respeito à transformação de aspectos práticos da vida em
conhecimento racional, abstrato e universal. Esses conhecimentos provêm da
prática comercial e marítima, da invenção da moeda, do calendário e,
principalmente, da organização política da cidade organizada por leis e
instituições públicas. A democracia é uma forma inédita de organização política
que não se baseava mais no poder tradicional do patriarca (do chefe de família,
da tribo ou do rei), aliado ao poder sacerdotal.
Em relação à razão
Os
gregos inventam uma forma laica de discursar, relacionada à prática e à organização
dos negócios públicos, isto é, à política. Essa fala dessacralizada busca
organizar sistematicamente seu pensamento em função de um princípio universal:
o conceito, a ideia, a lei, o axioma.
Os
primeiros filósofos ou filósofos pré-socráticos, embora não estivessem com suas
indagações voltadas exclusivamente para o contexto da pólis ateniense e para os
problemas éticos e morais, exercitaram o desprendimento da explicação religiosa
dogmática e elaboraram teorias sobre o surgimento do universo e de como este se
organiza.
Como
você pode notar, o mito também explica o surgimento do mundo em suas narrativas.
São Teogonias, isto é, narrativas sobre como as divindades ou deuses (Théos)
foram gerados (“gonia” vem de genos, em grego, geração, gênese).
Essa
geração, como a dos humanos, era entendida como procriação e, por isso, os
seres (a Terra, o Céu) e as divindades copulam e geram outros seres. A
explicação para tudo o que existe é de ordem sobrenatural. Igualmente, as
cosmologias procuram por uma explicação para o surgimento da ordem na natureza
e no mundo, e, mesmo que ainda utilizem, às vezes, o vocabulário, o mito, a
causa nomeada é de ordem racional.
Antes
de reconhecermos os princípios encontrados para a explicação do cosmos, vamos
ver quais são as preocupações gerais dos pré-socráticos, conforme Mondolfo
(1971), em O pensamento antigo
Qual
é a origem de todas as coisas?
Como
um único princípio pode dar origem à multiplicidade das coisas?
Como
o imutável pode dar origem ao mutável?
Como
o múltiplo retorna ao múltiplo?
Esse
mesmo autor nomeia as seguintes características, algumas mais evidentes, outras
menos, nas teorias dos pré- socráticos:
Trata-se
de uma cosmologia enquanto explicação sobre a ordem presente do mundo em vista
de sua origem ou causa, forma, transformação, repetição e término;
A
phýsis (natureza, “brotação”), palavra traduzida por natureza, é o fundo
imortal e perene de onde tudo brota e para onde tudo regressa. Ela é a
qualidade primordial da origem e constituição de todos os seres.
A
manifestação invisível da phýsis, com as mesmas características, mas só
alcançável pelo pensamento, é a arkhé (princípio, começo, ponto de partida,
princípio organizador do cosmos);
Há
uma preocupação marcante com o devir ou vira-ser.
O
movimento kínesis (movimento, ação) ou movimento de transformação dos seres
ocupa papel central nas teorias, bem como seu contrário: o repouso e a
estabilidade dos seres;
Há
distinção entre “aparência” e “essência”, principalmente nos pensamentos de
Heráclito e Parmênides. À primeira se relaciona a dóxa (opinião) e à segunda, a
essência.
Agora
que você já tem ideia de quais são as preocupações e características das
cosmologias pré-socráticas, vamos estudar cada uma delas!
Fonte: Educação,
história e sociedade : módulo 1 : Filosofia e Educação, volume 2 / Elaboração de conteúdo:
Carla Milani Damião. – [Ilhéus, BA] :
UAB/UESC, [2009]. 1 v. (várias
paginações).
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